II Domingo do Advento - ano B - Frei João Santiago
II Domingo do Advento (Mc 1, 1-8)
Tantas promessas neste mundo. Tanta oferta de felicidade. Muitos são os pensamentos e opiniões de uma vida melhor. Tantas expectativas colocamos em pessoas, em filosofias e religiões. Tanta espera feita ao amanhã. Tantos sonhos de realizações. Certamente tantos frutos serão colhidos e outros tantos não. Haverá sucessos e haverá desilusão. O Evangelho de hoje nos fala de um princípio maior, de um novo e real início e recomeço, de uma esperança certa..... :
“.... Eis que envio o meu anjo diante de ti: ele preparará o teu caminho. Uma voz clama no deserto: Traçai o caminho do Senhor, aplanai as suas veredas (Mal 3,1; Is 40,3). João Batista apareceu no deserto e pregava um batismo de conversão para a remissão dos pecados. E saíam para ir ter com ele toda a Judéia, toda Jerusalém, e eram batizados por ele no rio Jordão, confessando os seus pecados. João andava vestido de pêlo de camelo e trazia um cinto de couro em volta dos rins, e alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre. Ele pôs-se a proclamar: ‘Depois de mim vem outro mais poderoso do que eu, ante o qual não sou digno de me prostrar para desatar-lhe a correia do calçado. Eu vos batizei com água; ele, porém, vos batizará no Espírito Santo’”.
- Sejamos humildes, reconheçamos que certamente não somos perfeitos e que precisamos melhorar em algo. Vamos, portanto, ao deserto com João Batista. Lá ouviremos: “Convertei-vos dos vossos pecados” (cf. 1,4). O deserto não é lugar para moleza: se não se faz algo para viver, morre-se. Vestes por escolher, adereços, enfeites, perfumes, lugares por frequentar, pessoas para passear, carros, padrão de vida, segurança física e de saúde, o trato por se dar, bens por dispor. Nada disso se tem no deserto. O deserto nos faz pensar sobre o que conta realmente na vida. O deserto quase que nos obriga a mudar nossas convicções, opiniões, julgamentos, ações, pois deixa cada um nu e só diante de si e de seu interior. Não é por acaso que evitamos entrar no deserto, no silêncio, na oração, em uma conversa franca. Mas, para ser franco, todo vez que nos sentimos num “deserto” é sinal de que o mal está sendo incomodado. É uma chance para afrontarmos o mal e sairmos vitoriosos.
- Conversão: ao invés de só criticar por que não confiar e estimular as pessoas? Conversão: afrontar os medos e os males que nos acossam. Crer num Deus e Senhor que ama, e sentir-se aceito por Ele, também é conversão. Conversão: cuidar expressando respeito, compaixão, ternura para com toda criatura. Conversão também é violência: afrontar com força nosso apego visceral ao mundo do “ter e ter mais”, ao mundo do usar e abusar de coisas e pessoas em vista de um mero prazer e deleite meu.
Conversão: tenhamos a ousadia de verificar como vivemos nesse nosso corpo? Com amor ou com o egoísmo? Endireitemos os caminhos do Senhor, eliminemos a “carga torta”: que os pés caminhem, que os olhos vejam, as orelhas escutem, a boca comunique e não minta, o nariz se aproxime e não repudie, as mãos toquem e não sejam indiferentes. Que o homem seja liberado, libertado dos ídolos (quem é o Senhor de tua vida? Por qual motivo decides isso ou aquilo?).
Conversão nos leva ao perdão. Perdão nos leva à cura desligando-nos dos fracassos nos quais estivemos mergulhados no passado.
- Que o nosso desejo maior seja desatado, liberado, libertado, solto, entre em alto mar. Principalmente os que estão na “meia idade” correm sério perigo de se fixarem nas próprias escravidões, apresentando-se como pessoas bloqueadas, “rígidas”, encouraçadas, incapazes de uma novidade na vida. O Evangelho nos incita a fazer desabrochar nossa verdadeira identidade e a vislumbrar flores que a vida tem a ofertar: “Uma voz clama no deserto: ‘Traçai o caminho do Senhor, aplanai as suas veredas’ ... E saíam para ir ter com ele toda a Judéia ... confessando os seus pecados”. Ao clamor de João, muitos responderam. Qual clamor ou quais clamores e apelos são nos feitos neste momento presente de nossa vida? Muitos “saíram” e foram ao encontro de João Batista. Eu, você, nós somos chamados a “sair” e “deixar” para ir ao encontro de um renascer, de uma novidade boa de vida, de uma redenção maior, de um fazer as pazes com a própria historia cheia de alegrias e também de enganos, crimes e pecados (ofensas dadas, ofensas recebidas).
- O “batismo de João”. Eu em meio às águas. Águas que matam e fazem viver. Reconheço que sou frágil em meio às águas (são mais fortes, podem me afogar). Além de frágil reconheço meus pecados e crimes. Indo ao batismo de João deixo que se abata o meu orgulho, o meu eu jactoso, minha “hybris”, e aceito, também, minha caducidade. Convidando-me ao batismo, João, fortemente, lembra-me que sou mortal, e impele-me a destruir falsas ilusões e certas resistências são abatidas. Queira Deus que o coração seja atingido pelo batismo, pois o coração é o centro das decisões, das escolhas, e as escolhas decidem meu amanhã, meu futuro, meu “destino”.
- Conversão. Façamos uma revisão de vida. Pode ser que fomos no passado ou somos no presente rejeitados, não bem quistos, manipulados. Talvez não temos a coragem e humildade para lidar com nossa agressividade, luxúria, ódio, vingança. Não é por acaso que criamos uma falsa identidade ou personalidade.
- O cansaço da vida, o desgosto, a melancolia. Quem permanece no “batismo das águas” corre o risco de morrer afogado. Não basta o “batismo de João Batista”, não basta reconhecer-se pecador. Urge um passo adiante, um degrau a mais. O Espírito é o respiro, a vida de Deus. São João Batista nos testemunho e nos dá o exemplo de como devemos anelar e esperar a condição de filhos de Deus, a filiação divina, o “batismo de fogo”. “Depois de mim vem outro ... Eu vos batizei com água; ele, porém, vos batizará no Espírito Santo’".
- Façamos nossa parte: recebamos o “batismo de João” (batismo das águas). Mas, precisamos também do “batismo de fogo”. Fogo que purifica, elimina escória, falsidades que criamos de nós mesmos. O “batismo de fogo” visa destruir o falso e fazer brilhar a verdadeira pessoa que és tu. No dia em que uma pessoa nos olhar e perceber o “divino” em nós enquanto presença de bonança, verdade e forte fidelidade, naquele dia teremos a certeza que fomos de verdade batizados no “fogo”.
Vestido de pele de camelo. O camelo é o animal que atravessa desertos. Jesus foi aquele que por primeiro atravessou o deserto da morte. Nos vistamos de peles de Camelo, isto é, nos vistamos de Jesus, sejamos livres, pessoas livres, não mais sabotados e não mais chantageados. Assim venceremos os desertos presentes na vida.
- “... alimentava-se de gafanhotos”. O povo dizia que certos gafanhotos comiam serpentes. Há um alimento que mata a serpente, a mentira sobre Deus e sobre o homem (cf. Gen.3) que é a origem do mal. A serpente mente sobre Deus, mas não nos deixemos enganar: não é verdade que o mal e o sofrimento prevalecerão. A serpente mente sobre o homem, mas não nos enganemos: não é verdade que o homem seja abandonado por Deus. João Batista se alimentava dessa verdade que destrói a mentira acerca do homem e acerca de Deus. Sejamos fortes em nossa adesão ao Deus da vida e manteremos, assim, a nossa esperança e a nossa caridade, aconteça o que acontecer.
- “... alimentava-se ... de mel selvagem”. É um convite a nutrir-se da Palavra doce de Verdade. O bem, a verdade, o justo, o puro: tudo que é bom se torna agradável como mel na boca.
Verdade tremenda. A humanidade poderá viver ou sobreviver sem o Messias Jesus de Nazaré, filho de Maria. Mas sobreviverá como uma moça que anseia por casar, mas não ver aparecer o noivo. Será uma vida, mas uma vida pesada, sem gosto, sem vitalidade. Por isso João Batista disse: “...não sou digno de me prostrar para desatar-lhe a correia do calçado dEle”. Isto é: somente enlaçando-nos n´Ele, o Senhor, é que seremos vivos, fecundos, criativos, cheios de vida, vida que vence até a morte.